Aprendi que podemos ter o melhor do lugar onde vivemos, independente de onde seja, bastando ter boa vontade e olhos atentos. Fotografar Porto Alegre se tornou um hábito gostoso.
Lançar novos olhares sobre o conhecido, sobre o que está ali, desde sempre, tem me feito viajar sem sair de casa.
Viva o Centro a Pé é um projeto da Prefeitura Municipal de Porto Alegre, que consiste em uma Caminhada Orientada por professores universitários, historiadores, estudiosos de história da arte ou arquitetos, que narram a história dos prédios e áreas de cada trajeto.
Imagem de Divulgação - Viva o Centro a Pé - Liane Klein
Os roteiros, desenvolvidos no Centro Histórico, variam a cada edição, mas envolvem a parte baixa e alta do centro da cidade.
No último dia oito participei da edição orientada pelo Arquiteto Luiz Merino, integrante da equipe do Patrimônio Histórico e Cultural (EPAHC) e consultor de patrimônio cultural do Projeto Monumenta, da Secretaria Municipal de Cultura.
Imagem de Divulgação - Viva o Centro a Pé - Liane Klein
Afirmo que foi a melhor Caminhada Orientada que já fiz, pois Merino possui um conhecimento profundo da história arquitetônica de Porto Alegre, além de ter trabalhado diretamente no restauro e revitalização da Praça da Alfandega e da Igreja das Dores, importantes patrimônios da cidade.
Na edição os trabalhos se desenvolveram entre a Praça da Alfandega e a Igreja das Dores, passando pela Casa de Cultura Mário Quintana. Pelos caminhos, as surpresas - basta olhar para o alto, sempre!
Fiquei encantada com o número de pessoas que acompanharam a Caminhada, foi espetacular.
O passeio foi coordenado por Liane Klein, uma entusiasta do projeto. Por mais de duas horas circulamos na parte baixa do Centro Histórico de forma organizada, com paradas estratégicas.
Imagem de Divulgação - Viva o Centro a Pé - Liane Klein
O Centro Histórico de Porto Alegre estará sempre no Mochilinha, ganhando, eventualmente, novas nuances. Tenho absoluta convicção que ele somente se manterá e receberá os cuidados de que precisa na medida que nós, enquanto moradores da cidade, o valorizarmos.
O trajeto teve inicio na Praça da Alfandega, antiga entrada da cidade, que está junto ao Cais do Porto e, a partir de onde a cidade se expandiu. Importante centro social no incio do século passado, hoje guarda alguns dos prédios mais emblemáticos da capital.
Os relatos de Merino nos situaram no tempo, pois partiu da época anterior ao que hoje percebemos na região, narrando a construção e demolição de antigos prédios, aterros da área, remodelação do espaço e construção dos principais prédios históricos hoje ali encontrados - Margs, Museu do Mercosul, Santander Cultural, antigo Cine Imperial (futuro Centro Cultural da CEF) e antiga Farmácia Carvalho (atual Banco Safra).
Somente a história da praça, em si, já faria uma edição. Seu surgimento enquanto porta de entrada da cidade, de quem e do que chegava pelo porto, o desenvolvimento com os trabalhos de alfandega e de fiscalização de imigração, passando por uma certa desconstrução para tomar a forma que hoje conhecemos. O posterior abandono, até minucias dos trabalhos de revitalização há poucos anos, para chegarmos ao que temos hoje.
Os trabalhos para que a praça retomasse seu traçado original, com a vegetação tipica de seu auge, foi um dos trabalhos desenvolvidos pelo Projeto Monumenta. Foi procedida a retirada das árvores estranhas, das espécies que foram crescendo sem controle, a poda e realocação das árvores históricas, até que sua forma voltasse ao que era e que, com a vegetação mais aberta, ficasse mais clara e permitisse uma maior sensação de segurança.
Somos uma capital açoriana e, como tal, nossos espaços históricos são fartos em calçamento de pedras portuguesas. A dificuldade em encontrar profissionais calceteiros fez com que fosse contratado um especialista que procedeu ao treinamento de uma equipe, bem como foi o responsável pela fiscalização dos trabalhos. A iluminação original ainda existente foi retirada e restaurada, sendo as unidades faltantes substituídas por novas, respeitado o desenho original.
Explicações sobre o estilo eclético dos prédios ali construídos, com influência do barroco alemão, da art déco e art nouveau, foram a cereja do bolo. Observações sobre a história dos arquitetos envolvidos, na maioria de origem alemã, me fizeram entender melhor a mistura de um eclético muito nosso.
Visitante assídua e apaixonada do Margs - Museu de Artes do Rio Grande do Sul, dessa vez recebi informações sobre a construção, forma de alocação de materiais e inspiração dos espaços. Jamais havia percebido que o salão principal é inspirado nas termas romanas, por exemplo. As imagens da cobertura de vitrais, que é espetacular, foi prejudicada por estar a mesma recoberta por lonas para a proteção das obras expostas dos feixes de luz intensa.
Como o projeto é da Prefeitura Municipal, foi aberto para a visitação o terraço do Museu. Um lugar espetacular, com salões laterais e de onde se tem uma visão diferenciada da praça e do rio, um novo olhar sobre a cidade.
Após essa primeira etapa, fomos fazendo paradinhas em pontos estratégicos. Primeiramente, junto ao antigo Cine Imperial, local de grande importância politica e cultural no século passado, ponto de encontro de jornalistas, escritores e políticos. O edifício no plano principal é o Clube do Comércio, com um lindo salão de espelhos no interior, e o recoberto é o Centro Cultural.
O prédio é um exemplar de um art déco muito brasileiro, com desenhos marajoaras. Contava com o cinema e lojas na parte térrea e com os primeiros apartamentos duplex da cidade. Fui informada que quando de sua reinauguração não mais encontrarei os mármores espetaculares com os quais convivi na infância e adolescência, quando frequentava o cinema. Razões? Poucos meses antes de se dar o inicio as obras de revitalização um grupo se instalou, sorrateiramente, no interior do prédio. Fez a retirada de todos os materiais de valor e objetos de adorno, que eram levados na calada das noites. Atualmente em obras, será reinaugurado como Centro Cultural da CEF, um cine teatro com espaço especial para dança.
Ao lado, o atual Banco Safra, que reuniu a fachada de duas importantes construções da cidade. O principal com arcos alemães e carrancas, enquanto o segundo é um belo exemplar de art nouveau, a antiga Farmácia Carvalho. Nas mãos de particulares, somente as fachadas foram, efetivamente, preservadas dentro de sua originalidade.
O pavão, um dos símbolos do art nouveau.
Uma passada pelo atual Museu Hipólito da Costa, uma parada num dos últimos exemplares de casas de azulejos da cidade (desfigurada) e na antiga casa da família Varejão, a Casa Amarela.
Sempre fotografo a Cariátide, sem jamais ter atentado para o fato de não ser uma. Meus olhos afoitos não perceberam o detalhe, de que a mesma não carrega o entablamento sobre a cabeça, mas sobre as costas.
Na sequência a deliciosa parada na Casa de Cultura Mário Quintana, para ouvir os detalhes construtivos sob o olhar de Merino.
Por último? Encerramos com a Igreja das Dores. Detalhes sobre as obras de revitalização, detalhes arquitetônicos e sobre o acervo (segundo Merino, espetacular) de Arte Sacra - que não se encontra disponível para visitação, eis que não possui espaço para exposição.
Pouco mais de duas horas, horas deliciosas, lançando novos olhares sobre o que vejo, desde sempre.
Se vale? Cada minuto.
O Projeto Viva o Centro a Pé reiniciou suas atividades com essa linda caminhada. As informações sobre as edições podem ser encontradas no facebook.
Paula, que post delicioso! Certeza que vou procurar fazer essa caminhada, qdo estiver em POA! Obrigada pela dica! :)
ResponderExcluirAbraços,
Ana Christ