Ó Linda: ladeiras com muita história para contar!


Num dia absolutamente congelante como hoje (ontem, na verdade), busco inspiração no calor para mais um post. E qual local escolher? Aquele que está esperando por um momento de inspiração desde que o Mochilinha entrou no ar: Olinda! 

Já estive por diversas vezes na bela cidade, curtindo suas ladeiras, a vista do Mar, seu casario em estilo colonial, seu jeitinho de interior antigo - claro que nunca me aventurei numa semana de Carnaval, quando então não poderia utilizar de expressões tão suaves para descrevê-la. Mas foram dias de muita observação, de muito papo, de algumas comprinhas.


Uma das cidades mais antigas do Brasil, situada na região metropolitana do Recife, foi a segunda cidade brasileira a ser declarada Patrimônio Histórico e Cultural da Humanidade, pela Unesco. Com origem numa tribo Tupi Caeté, se transformou em povoado com a fundação do primeiro engenho de açúcar, ainda nos anos de mil e quinhentos. A partir desse povoado tem-se a origem da arquitetura que ainda hoje se encontra bastante preservada. Soma-se a isso a invasão Holandesa e suas contribuições.



Percorrer suas ruas de pedras, subindo e descendo ladeiras, com paradas para observar o Mar a distância, suas cores, seus sons, é sempre especial. E mesmo tendo passeado por lá, com olhar atento, sei que ainda há muito o que descobrir, o que esmiuçar. 

Sua gente? Um misto de moradores, empreendedores e de vendedores. Lá se observam muitas casas com cortinas rendadas nas janelas, com pessoas idosas sentadas na calçada, muita gente andando sem pressa. Mas há muitas crianças entrando e saindo daquelas casas, na companhia normalmente dos avós, já se criando responsáveis por preservar a encantadora cidade. Para quem como eu mora em meio ao barulho do progresso, observar o silêncio daquele povo (não há o que concorra com suas vozes mansas, não há motores, buzinas e gritos), sua tranquilidade já é uma viagem. 

Para quem gosta de história, o ideal é perambular por lá com um guia, especialmente se der sorte de encontrar um dos bons. Há muita história para ser contada, muitos detalhes para serem descobertos. Por duas vezes minhas caminhadas se fizeram acompanhar por guias turísticos, mas apenas numa o papo saiu do óbvio. E como é bom ser surpreendido pela imagem do que você já conhece, mas nunca viu, não é mesmo? História é isso, é tirar daquele livro empoeirado que se encontra na prateleira, uma imagem viva, que está alí pelas ruas... Em Olinda, muitas imagens vivas saltaram de meus livros para minha vida. Mas como percebi pessoas que nada conheciam, mas que se perdiam encantadas por aquelas ruelas tão cheias de histórias, de tanto a se descobrir.


O que dizer daquele casario, de portas e janelas de madeira robusta, mas com fachadas tão coloridas? Mas tem certeza que sabes o que significam tantas cores em apenas uma rua? Seria por conta de algum arranjo carnavalesco? Certamente que não. Antigamente, bem lá do fundo do  baú, as ruas possuíam nomes ou números, mas as casas não contavam com numeração. Assim, casas de pessoas comuns, sem títulos e sem posses, não possuíam diferencial - como saber quem eram seus moradores? Para facilitar a identificação, para envio de correspondências ou para cobrança de impostos (sempre se fez muito isso nesse País), cada casa era pintada com uma cor, de modo a diferenciá-la e facilitar a identificação de seu proprietário. 
*fico devendo a imagem do casario colorido, pois não localizei o arquivo.

Tantas casas, tantos pequenos jardins. Mas meus olhos não se furtaram de umas arvorezinhas floridas, jamais vistas por essa gaúcha. Lá fui cutucar o guia para saber qual o nome de tão bela espécie, no que fui informada tratar-se de Mussaendas. Mas as simpáticas árvores possuem história, como quase tudo o que se vê por lá! Contam os antigos, que os negros ao serem capturados para servirem de mão-de-obra escrava no Brasil, tentavam de toda a forma trazer lembranças de sua Terra. Assim, os pequenos e floridos arbustos teriam se originado das sementes trazidas nos cabelos das negras e nas dobras dos panos que  serviam de roupas para as africanas que por ali chegavam em navios negreiros. Fantasiosa a história? Mas toda história tem que ter seu charme, um pouco de lenda e um olhar suave para de terrível ser transformada em folclórica, não é mesmo? Hoje são apenas histórias poéticas que se espalham de geração em geração e que encantam e alegram os turistas. Mas, em verdade, possuem efetivamente origem africana. 

E as muitas eiras, beiras e tribeiras avistadas pelas ruas de Olinda? Nesse momento vi pessoas encantadas com a história, com o desconhecido de algo tão popular. Quantos de nós não dizemos, muitos até com certa frequência, que sicrano é sem "eira e beira"? O que pretendemos dizer com tal expressão? Que o mesmo é desprovido de bens materiais, de posses, de condições. Pois bem, e de onde surge tal expressão? Lá vai mais um capitulo dos livrinhos de história que se encontra nas ruas de Olinda. Eira é um terreno plano, utilizado para secar grãos - que para não se espalharem ao prazer dos ventos necessita ser construída a beira, a beirada. Se o proprietário não tem posses para a construção da beira, está condenado a perder sua produção lançada sobre a eira. Pois bem, na arquitetura, de uma forma emblemática, isso foi utilizado como uma distinção social. As casas do período colonial, especialmente no Nordeste, recebiam níveis de telhados de acordo com as posses de seus moradores. As casas populares contavam apenas com um nível de telhado, a tribeira. As famílias intermediárias, que contavam com uma situação social mais favorável, obrigatoriamente possuíam eira e tribeira. Mas apenas as famílias de posses contavam efetivamente com os três níveis de cobertura determinados pela ordem social vigente: eira, beira e tribeira.

A religiosidade? Muito presente, como em toda área colonial. Igrejas, Conventos, belas construções, lembranças de muita riqueza, mas hoje palco de muito abandono, na sua grande maioria. Mas encantam.



Atualmente, a cidade é turística. E sendo assim, após muitas subidas, muitas ladeiras, muita história, se chega ao conjunto comercial - casas que vendem toda a sorte de artesanato local. Oferecem objetos de todos os tamanhos e para todos os bolsos. Mas não pense que você precisa comprar tudo o que vê, mas precisa observar tudo o que pode. Muitas belezas não necessitam ser levadas nas malas, mas no coração. Muito artesanato de chita, de barro, de madeira e muita, muita renda. Mas quem vai muito ao Nordeste sabe, se cada vez for trazer uma lembrancinha linda, as gavetas ficarão abarrotadas de toalhas e guardanapinhos, então muitas vezes vale mais o olhar.









Nos espaços comerciais certamente você vai se deparar com um show de Frevo. Não deixe de curtir a agilidade e os malabarismos dos jovens bailarinos. E antes de dar as costas, não esqueça de colaborar com o artista local, que está ali para alegrar seu dia.



Comprou, coloriu seus olhos e coração, olhe em frente e pense: para "baixo todo o Santo ajuda". Mas escolha outro caminho, faça voltas, se embrete pelas ruelas, descubra.



Chegou na pracinha, é hora de ir embora. Mas quase todos os grupos são acompanhados por guias locais, mesmo que seu grupo possua um guia turístico contratado. São guias da cidade, pessoas tiradas da margem social e integradas através do conhecimento, da cultura. Então, se você usufruiu daquele conhecimento e daquela companhia, não deixe de fazer sua colaboração - que é espontânea, de qualquer valor. Dê importância para o que é mais importante de tudo o que você viu: pessoas. 






Um comentário

  1. Já visitamos Olinda 2 vezes mas pretendemos voltar. É assim mesmo aqule sossego nordestino, lá de cima sempre se tem uma visão interessante : mar,telhado do casario, igrejas

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